Moçambique on-line

mediaFAX de 18 de Dezembro 2002

1. Juiz disposto a receber inquérito à fuga de Anibalzinho
3. Editorial: UMA MANCHA INDELÉVEL
3. Outra vez Nini
4. Defesa prescinde de duas testemunhas


Caso Carlos Cardoso:
Juiz disposto a receber inquérito à fuga de Anibalzinho

(Maputo) O juiz que julga o caso do assassinato do jornalista Carlos Cardoso indeferiu ontem um pedido da defesa no sentido da divulgação do relatório à fuga de Anibalzinho, mas manifestou-se disposto em receber o documento, no caso de o Ministério Público fazê-lo chegar ao Tribunal. Um pedido para a divulgação desse relatório no julgamento foi insistentemente formulado pelo advogado Abdul Gani Hassan, que representa o réu Vicente Ramaya. Gani argumentou que a divulgação do tal relatório era de extrema importância na medida em que isso contribuiria para a produção da prova. "Creio que é fundamental divulgar os resultados do inquérito pois parece-me que nele se faz uma conexão entre os mandantes do crime e os interessados na fuga de Anibalzinho", disse Gani.

O juiz Augusto Paulino optou por considerar irrelevante a divulgação desse relatório no Tribunal. "O Tribunal não trabalha com inquéritos. Sabemos dos muitos inquéritos que nunca terminam e de outros que nunca são divulgados," afirmou o juiz. Mas o seu argumento relevante para o indeferimento foi o de que, "logo após a fuga de Anibalzinho, o Juiz proferiu os despachos judiciais necessários relacionados sobre o assunto". Paulino abriu, no entanto, portas para o Ministério Público, a entidade que elaborou o inquérito, apresentá-lo ao Tribunal.

Em vários círculos que lidam com este caso, a fuga de Anibalzinho terá sido orquestrada para se evitar a clarificação da identidade dos mandantes do assassinato do jornalista Carlos Cardoso. Na opinião pública aguarda-se com grande ansiedade a divulgação dos resultados desse inquérito.
(da redacção)

[topo]


Editorial
UMA MANCHA INDELÉVEL

Ao cabo de um mês, o julgamento do caso Carlos Cardoso vai ficar na memória colectiva dos moçambicanos como um ponto de partida na tentativa do restabelecimento do Estado de Direito em Moçambique. Apesar das várias nuances que o crime apresenta, criando muita confusão na opinião pública no que diz respeito à identidade dos mandantes, avultando conjecturas sobre uma alegada dualidade de critérios na decisão (ou não) das medidas de coação sobre os suspeitos, o julgamento tem tido um papel aglutinador da sociedade relativamente ao imperativo do combate ao crime oganizado e à corrupção.

Também pode ter um efeito dissuasor a longo prazo, esconjurando apetites criminosos na sociedade, embora esta demonstração do poder judicial possa também levar, como sempre foi, a um aperfeiçoamento dos métodos criminosos. Seja como for, este julgamento está a contribuir para a redução da desconfiança dos cidadãos em relação às instituições, o que é fundamental para o fortalecimento da nossa democracia. Mas, como dissemos, trata-se apenas de um ponto de partida, um take off que precisará de mais alavancas para que a marcha avance. E para que haja uma verdadeira viragem na administração da justiça é preciso que mais casos sejam julgados, como o caso BCM, permitindo também que, pouco a pouco, se registem melhorias na nossa investigação policial, infelizmente ainda muito manipulada por interesses obscuros.

Estamos em crer que existe agora uma clara anuência do poder político para que o poder judicial avance até às últimas consequências. A sensação que temos é de que a bola está do lado da administração da justiça no seu todo (e não só a magistratura judicial). Ao cabo do primeiro mês do julgamento, parece-nos que a magistratura do Ministério Público ainda não se libertou, como se impunha, da sua dependência do poder político. O efeito postivo que o julgamento pode ter corre o risco de ficar esvaziado se o Ministério Público continuar a manter na gaveta o relatório à fuga de Anibalzinho. O juiz Paulino tem estado a lançar vários recados à magistratura do MP, mas deste lado, exceptuando algumas decisões pontuais do Procurador Mourão, parece não haver a necessária correspondência.

Vivemos, portanto, entre esta lufada de ar fresco e o risco de, de repente, nos voltarem a asfixiar na mesma ausência de poder judicial que permitiu que a podridão chegasse onde chegou. Apesar dos méritos do julgamento, paira cada vez mais o cheiro de uma mancha indelével neste processo: o Ministério Público. Para nós, a única coisa que nos pode fazer crer que o Ministério Público esteja igualmente embalado neste ímpeto correctivo é entregar imediatamente ao Tribunal o relatório à fuga de Anibalzinho. Caso isso não aconteça, o Procurador Joaquim Madeira vai-se atolando na lama da irrelevância, tal como todos os seus antecessores.

[topo]


Outra vez Nini
O mais novo dos Satar é o réu sobre quem pesam os mais graves indícios de autoria moral do assassinato de Carlos Cardoso; agora foi acusado de ter preparado a fuga de Anibalzinho

(Maputo) Nini Satar parece estar num beco sem saída. A cada dia que passa surgem novas declarações que lhe apontam como o principal responsável de toda a conjura à volta do assassinato de CC. Ontem, o último testemunha da acusação, Marcial Muthemba, declaraou em Tribunal que Nini esteve envolvido nos preparativos da fuga de Anibalzinho. "Ele mostrou-me que sabia que Anibalzinho ia fugir. Ele disse-me que ele não podia fugir porque tinha vários negócios em Moçambique", disse Marcial, que é um cadastrado e encontra-se neste momento detido na cadeia civil. Esta testemunha disse ter querido avisar o Tribunal e a Polícia sobre os preparativos da fuga de Anibalzinho mas nunca chegou a ter essa oportunidade. A sua detenção ocorreu poucos meses antes do assassinato do jornalista, mas o Ministério Público achou importante arrolá-lo como testemunha na medida em que Marcial terá presenciado várias conversas entre os réus, na BO, à volta do caso.

Ele identificou-se como moço de recados de Nini na BO, transportando correspondência e celulares. Disse ter travado conhecimento com o mais novo dos Satar em 1997 e, nesse ano, Nini pagou-lhe a caução que o libertou condicionalmente na sequência de um caso anterior não revelado. Marcial contou que, nas conversas com Nini, este chegou a dizer-lhe que havia querido contratar Rohit Kumar para assassinar CC, mas que Kumar recusara a oferta de 150 mil USD para fazer o "trabalho".

Entre as várias revelações de Marcial consta a de que, certa vez, Nini apareceu-lhe com uma lista de alvos a abater, onde constavam os nomes de Frangoulis, Albano Silva, Humberto do Kaya Kwanga, Remane (Polícia) e um funcionário do banco não identificado. Para Marcial Muthemba, o principal mandante do crime contra CC é Nini. "Mas Nini sempre falou de Nyimpine Chissano. E quando me ameaçava, ele sempre falava que Nyimpine é que estava envolvido nisto".

Para Marcial Muthemba, os depoimentos de Manuel Escurinho e Carlisto Rachid no julgamento, incriminatórios de Nyimpine Chissano, foram "trabalhados" por Nini a troco de "500 milhões de Meticais e uma carrinha para 'chapa' para cada um".

A defesa tentou invalidar o testemunho de Marcial argumentando que "o facto de ele estar detido fazia dele uma testemunha inábil". O Ministério Público contra-argumentou alegando que, embora tenha sido detido antes do assassinato de CC, Marcial podia testemunhar dado que ele presenciou conversas entre os réus na cadeia.
(M.M.)

[topo]


Defesa prescinde de duas testemunhas
Teodoro Waty vai ser interrogado hoje

(Maputo) A defesa do caso CC prescindiu ontem de duas testemunhas que haviam sido arroladas previamente pelo advogado de Ayob Satar, Domingos Arouca. As duas testemunhas, Jaez Magnalal e Raciclal Magnalal, empregados da Unicâmbios, compareceram ontem ao Tribunal prontas para serem interrogadas, mas Arouca achou por bem prescindir, causando alguma curiosidade na sala.

Sendo empregados na Unicâmbios, é de crer que os dois iriam depor a favor dos irmãos Satar. Na sessão anterior, uma das testemunhas da acusação, relevante para a incrimação dos irmãos Satar, Rohit Kumar, não compareceu ao Tribunal. Kumar disse na instrução contraditória que, 18 meses antes do crime, ele foi contactado pelos irmãos Satar, na Unicâmbio, no sentido localizar alguém para assassinar o jornalista Carlos Cardoso. A sua ausência em Maputo parece ainda misteriosa.

Hoje, o Tribunal vai interrogar as testemunhas da defesa, algumas já ouvidas em instrução contraditória, outras ainda não ouvidas. Uma delas é o Presidente da Assembleia Municipal de Maputo, Teodoro Waty, na sua qualidade de PCA do Casino do Hotel Polana. Crê-se que três antigos magistrados do Ministério Público também serão interrogados hoje.

Ontem, entre os requerimentos da defesa, destacou-se o pedido do advogado Eduardo Jorge no sentido de o Tribunal voltar a chamar a "empresária" Cândida Cossa para "clarificar a questão do cheque de 1,3 bilhões de Mts". Trata-se do cheque referente aos valores que o réu Nini Satar disse terem a ver com os pagamentos a Anibalzinho e que alegadamente lhe foi entregue pessoalmente por Nyimpine Chissano. Recorde-se que Cândida disse ao Tribunal que foi ela própria quem entregou o mesmo cheque a Nini. O advogado Gani Hassane voltou a requerer a audição do antigo director da Polícia de Investigação Criminal, António Frangoulis, para clarificar aspectos relacionados com o seu encontro com a testemunha Dudu.
(da redacção)

[topo]


Moçambique on-line - 2002

Clique aqui voltar para voltar à página principal